OUTRASMÍDIAS – TERRA E ANTROPOCENO

EcoDebate – 21/12/2020 – Variedades brasileiras de batatas. Mas tente encontrá-las, no mercado ou feira mais próximos…
Relatório da FAO avisa: ao reduzir biodiversidade, ser humano corrói riqueza e segurança de sua alimentação. Fim dos vegetais silvestres torna cardápios monótonos e repetitivos. Mas surgem, em todo o planeta, práticas alternativas
Um estudo da FAO, no EcoDebate
De acordo com o relatório da FAO, a biodiversidade para a alimentação e a agricultura – ou seja, todas as espécies que apoiam nossos sistemas alimentares e sustentam as pessoas que cultivam e fornecem nossos alimentos – não pode ser recuperada.
No contexto da alimentação e da agricultura, essa biodiversidade representa todas as plantas e animais – silvestres e domesticados – que fornecem alimento, ração, combustível e fibra. É também a miríade de organismos que apoiam a produção de alimentos através de serviços ecossistêmicos chamados de “biodiversidade associada”.
Isso inclui todas as plantas, animais e microorganismos (como insetos, morcegos, pássaros, manguezais, corais, ervas marinhas, minhocas, fungos e bactérias) que
- mantêm os solos férteis,
- polinizam as plantas,
- purificam a água e o ar,
- mantêm peixes e árvores saudávei
- e combatem pragas e doenças de colheitas e do gado.
O relatório, elaborado pela FAO sob a orientação da Comissão de Recursos Genéticos para Alimentação e Agricultura, examina todos esses elementos e se baseia nas informações fornecidas, especificamente para este relatório, por 91 países. Ela também se baseia na análise dos dados globais mais recentes.

“A biodiversidade é fundamental para salvaguardar a segurança alimentar global, sustentar dietas saudáveis e nutritivas, melhorar os meios de vida rurais e a resiliência das pessoas e das comunidades. Precisamos usar a biodiversidade de maneira sustentável, para melhor responder aos crescentes desafios das mudanças climáticas e produzir alimentos de uma maneira que não agrida nosso meio ambiente ”,
disse o diretor-geral da FAO, José Graziano da Silva.
“Menos biodiversidade significa que plantas e animais são mais vulneráveis a pragas e a doenças. Com a dependência de cada vez menos espécies para se alimentar, a crescente perda de biodiversidade para alimentos e agricultura coloca a segurança alimentar e a nutrição em risco”,
acrescentou Graziano da Silva.
A base dos nossos sistemas alimentares está sob grave ameaça
O relatório aponta para
- a diminuição da diversidade de plantas nos campos,
- o aumento do número de raças de gado em risco de extinção
- e o aumento da pressão sobre os estoques de peixes.
Das cerca de
- 6 mil espécies de plantas cultivadas para alimentação,
- menos de 200 contribuem substancialmente para a produção global de alimentos,
- e apenas nove respondem por 66% da produção agrícola total.
Já a produção mundial de gado é baseada
- em cerca de 40 espécies de animais,
- com apenas um punhado fornecendo a grande maioria de carne, leite e ovos.
- Das 7.745 raças de gado locais (ocorrentes em um país) registradas globalmente,
- 26% estão em risco de extinção.
Quase um terço das unidades populacionais de peixe são sobre-exploradas: mais de metade atingiu o seu limite sustentável.
Informações dos 91 países revelam que
- as espécies de alimentos silvestres e muitas espécies que contribuem para os serviços ecossistêmicos vitais à alimentação e à agricultura,
- incluindo polinizadores, organismos do solo e inimigos naturais das pragas,
- estão desaparecendo rapidamente.
Por exemplo, os países relatam que
- 24% das cerca de 4.000 espécies de alimentos silvestres – principalmente plantas, peixes e mamíferos –
- estão diminuindo vertiginosamente.
- Mas a proporção de alimentos silvestres em declínio provavelmente é ainda maior, já que o estado de mais da metade das espécies de alimentos silvestres relatados é desconhecido.
O maior número de espécies de alimentos silvestres em declínio
- aparece nos países da América Latina e Caribe,
- seguido da Ásia-Pacífico e da África.
Isso poderia ser, no entanto, um resultado de espécies de alimentos silvestres serem mais estudadas e/ou reportadas nesses países, do que em outros.
Muitas espécies de biodiversidade associadas também estão sob grave ameaça. Estes incluem
- pássaros, morcegos e insetos que ajudam a controlar pragas e doenças,
- e a biodiversidade do solo e polinizadores selvagens – como abelhas, borboletas, morcegos e pássaros.
Florestas, pastagens, manguezais, pradarias de ervas marinhas, recifes de corais e zonas úmidas em geral –
- ecossistemas-chaves que fornecem numerosos serviços essenciais à alimentação e à agricultura e são o lar de inúmeras espécies
- – também estão em rápido declínio.
Principais causas de perda de biodiversidade
As causas da perda da biodiversidade para alimentos e agricultura citada pela maioria dos países tem relação com:
- mudanças no uso e manejo da terra e da água,
- seguidas pela poluição, super exploração e exploração excessiva,
- mudanças climáticas, crescimento populacional e urbanização.
No caso da biodiversidade associada, enquanto todas as regiões relatam alterações e perdas de habitat como grandes ameaças, outros fatores-chave variam:
- sobre-exploração, caça e caça furtiva na África;
- desmatamento, mudanças no uso da terra e agricultura intensificada na Europa e na Ásia Central;
- super exploração, pragas, doenças e espécies invasoras na América Latina e no Caribe;
- super exploração no Oriente Próximo e Norte da África
- e desmatamento na Ásia.
Práticas favoráveis à biodiversidade estão em ascensão
O relatório destaca um interesse crescente em práticas e abordagens favoráveis à biodiversidade. Oitenta por cento dos 91 países indicam o uso de uma ou mais práticas e abordagens favoráveis à biodiversidade, tais como:
- agricultura orgânica,
- manejo integrado de pragas,
- agricultura de conservação,
- manejo sustentável do solo,
- agroecologia,
- manejo florestal sustentável,
- agrossilvicultura,
- práticas de diversificação na aquicultura,
- restauração de pescas e ecossistemas.
Esforços de conservação,
- tanto no local (por exemplo, áreas protegidas, na gestão da fazenda)
- como fora do local (por exemplo, bancos de genes, jardins zoológicos, coleções culturais, jardins botânicos)
- também estão aumentando globalmente, embora os níveis de cobertura e proteção sejam, muitas vezes, inadequados.
Revertendo tendências que levam à perda de biodiversidade – o que é necessário
Embora o aumento de práticas amigas da biodiversidade seja encorajador, é preciso fazer mais para impedir a perda de biodiversidade para alimentos e para a agricultura.
A maioria dos países implementou estruturas legais, políticas e institucionais para o uso sustentável e a conservação da biodiversidade, mas estas são, muitas vezes, inadequadas ou insuficientes.
O relatório pede aos governos e à comunidade internacional que façam mais para
- fortalecer as estruturas de capacitação,
- criar incentivos e medidas de repartição de benefícios,
- promover iniciativas pró-biodiversidade
- e abordar os principais impulsionadores da perda de biodiversidade.
Maiores esforços devem ser feitos para melhorar o estado de conhecimento da biodiversidade para alimentos e agricultura, já que muitas lacunas de informação permanecem – particularmente para espécies associadas à biodiversidade.
- Muitas dessas espécies nunca foram identificadas e descritas, especialmente no caso dos invertebrados e microrganismos.
- Mas mais de 99% das bactérias e espécies protistas – e seu impacto na alimentação e na agricultura – permanecem desconhecidas.
É necessário melhorar
- a colaboração entre os políticos,
- as organizações de produtores,
- os consumidores,
- o setor privado
- e as organizações da sociedade civil nos setores da alimentação, da agricultura e do meio ambiente.
Oportunidades para desenvolver mais mercados para produtos amigáveis à biodiversidade devem ser mais exploradas.
O relatório também destaca o papel que o público em geral pode desempenhar na redução das pressões sobre a biodiversidade para alimentos e agricultura.
Os consumidores podem
- optar por produtos cultivados de forma sustentável,
- comprar em mercados agrícolas
- ou boicotar alimentos considerados insustentáveis.
Em vários países, “cientistas cidadãos” desempenham um papel importante no monitoramento da biodiversidade para alimentos e agricultura.
Exemplos de impactos da biodiversidade na perda de alimentos e agricultura, e práticas favoráveis à biodiversidade:
– Na Gâmbia, as perdas maciças de alimentos silvestres forçaram as comunidades a recorrer a alternativas, muitas vezes produzidas industrialmente, para complementar suas dietas.
– No Egito, o aumento das temperaturas provocará o deslocamento de espécies de peixes para o norte, com impactos na produção pesqueira.
– Escassez de mão-de-obra, fluxos de remessas e aumento da disponibilidade de produtos alternativos baratos nos mercados locais contribuíram para o abandono das colheitas locais no Nepal.
– Nas florestas amazônicas do Peru, prevê-se que as mudanças climáticas levem à “savanização”, com impactos negativos na oferta de alimentos silvestres.
– Fazendeiros californianos permitem que seus campos de arroz inundem no inverno em vez de queimá-los após o crescimento da estação. Isso proporciona
- 111.000 hectares de terras úmidas
- e espaço aberto para 230 espécies de aves, muitas delas em risco de extinção.
- Como resultado, muitas espécies começaram a aumentar em número. A quantidade patos, por exemplo, duplicou.
– Na França, cerca de 300.000 hectares de terra são manejados com base em princípios agroecológicos.
– Em Kiribati, a criação integrada de milkfish, sandfish, pepino do mar e algas marinhas garante comida e renda regulares, pois apesar das mudanças nas condições climáticas, pelo menos um componente do sistema está sempre produzindo alimentos.
EcoDebate
Fonte: https://outraspalavras.net/outrasmidias/diversidade-alimentar/
Leave a Reply