Expectativa sobre futuro do caso JBS, novas denúncias, decisão do Supremo e depoimento de Lula marcam momento brasileiro, em meio a reforma política e sensação de descrédito geral
João Paulo Charleaux – 11/09/2017
Foto: José Cruz/Agência Brasil – 02.03.2016 – Rodrigo Janot participa de sessão no Supremo Tribunal Federal, em Brasília
A nota foi divulgada no final de uma semana marcada pela divulgação de novos áudios da JBS, no qual o sócio majoritário da empresa, Joesley Batista, e o executivo Ricardo Saud, discutem abertamente formas de montar sua delação premiada à Lava Jato.
A nova gravação sugere a participação de um procurador da República na preparação dessa delação mesmo antes de haver um contato formal com o Ministério Público, algo que colocou em xeque o acordo que viria a ser celebrado posteriormente.
Além disso, na mesma semana, a Polícia Federal fez a maior apreensão de dinheiro vivo na história do Brasil. Mais de R$ 51 milhões apareceram guardados em caixas de papelão e malas de viagem, num apartamento que era usado pelo ex-ministro e ex-deputado do PMDB Geddel Vieira Lima. Geddel, que cumpria prisão domiciliar por suspeita de corrupção, foi mandado para a cadeia.
Houve ainda o depoimento de Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil, no qual ele afirmou que Emílio Odebrecht, dono da empreiteira que leva seu nome, fechou um “pacto de sangue” com Luiz Inácio Lula da Silva pelo qual pagaria R$ 300 milhões – ao ex-presidente e ao PT – para manter a influência durante o governo Dilma Rousseff.
A sucessão de fatos político-criminais adentrou o fim de semana, com a prisão de Joesley e Saud a pedido da Procuradoria-Geral da República. A determinação foi do ministro Edson Fachin, relator do caso JBS no Supremo Tribunal Federal. Em razão dos questionamentos que rondam a delação, Fachin resolveu suspender os benefícios da delação dados anteriormente a Joesley e a Saud.
Agenda turbulenta#
Todos esses fatos se conectam com eventos importantes de uma agenda que, partindo desta segunda-feira (11), têm o poder de alterar de maneira importante a política no Brasil.
Parte desses eventos depende da iniciativa do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Ele, que assumiu a função em 2013, tem até o fim do mandato, neste domingo (17), para apresentar a prometida segunda denúncia contra o presidente Michel Temer.
A partir de domingo (17), quem assume o lugar de Janot é Raquel Dodge, escolhida em junho por Temer para comandar a Procuradoria-Geral da República. O Nexo organizou abaixo, em quatro capítulos, o que está em jogo neste momento.
Na terça-feira (5), último dia da excursão, Lula foi denunciado por formação de quadrilha por Janot. Para o procurador-geral, o ex-presidente comandou uma organização criminosa durante seu governo (2003-2010) e durante o governo de sua sucessora, Dilma Rousseff (2011-2016).
No dia seguinte, Janot apresentou mais uma denúncia, esta por obstrução de justiça em razão da nomeação de Lula como ministro do governo Dilma em março de 2016 – nomeação que acabou barrada pelo Supremo. A pior notícia para Lula, porém, saiu de Curitiba.
O líder petista foi surpreendido pelo depoimento de seu ex-ministro Antonio Palocci, que negocia um acordo de delação premiada na Lava Jato. Ao falar para o juiz Sergio Moro no processo em que Lula é acusado de receber propina da Odebrecht, Palocci envolveu o ex-presidente diretamente na negociação de pagamentos da empreiteira. O ex-ministro está condenado a 12 anos de prisão e espera reduzir sua pena com uma eventual delação.
A ação em que Palocci depôs se refere à denúncia de que a Odebrecht deu propina a Lula por meio da entrega de um terreno avaliado em R$ 12,4 milhões, onde seria construído o Instituto Lula. O negócio acabou não se concretizando.
Lula vai depor a Moro nesta quarta-feira (13) e deve apresentar, pessoalmente, sua versão para as declarações feitas por Palocci. O ex-presidente já tem uma condenação em primeira instância no caso que envolve a troca de favores com a Odebrecht por meio de obras de melhoria num apartamento em Guarujá.
Os partidos têm até 15 de agosto de 2018 para registrar seus candidatos nas eleições de 2018. Se a condenação for confirmada em segunda instância, Lula perde o direito de concorrer.
Denúncias dos ‘quadrilhões’#
Foto: Nexojornal
Às vésperas de deixar o cargo, Janot está ingressando com as denúncias por formação de quadrilha na Lava Jato. Ele dividiu essas denúncias em quatro: “quadrilha do PP”, “quadrilha do PT”, “quadrilha do PMDB do Senado” e “quadrilha do PMDB da Câmara”.
As três primeiras denúncias, narrando acusações de desvios em contratos da Petrobras e outros órgãos públicos, já foram enviadas ao Supremo. Agora, a expectativa é que Janot ingresse com a denúncia que envolve a “quadrilha do PMDB da Câmara”.
Essa ação envolve políticos muito próximos do presidente da República, Michel Temer, entre eles o ex-ministros Geddel Vieira Lima, preso na sexta-feira (8) após a Polícia Federal apreender R$ 51 milhões em dinheiro vivo guardados em malas e caixas num apartamento usado por ele. Foi a maior apreensão de valores da história.
Em agosto, a Procuradoria-Geral da República chegou a pedir a inclusão de Temer no inquérito da “quadrilha do PMDB da Câmara”, mas o pedido foi negado pelo relator Edson Fachin, dias depois.
O chamado “PMDB da Câmara” é suspeito de ser beneficiário de desvios não só da Petrobras, mas também de empréstimos fraudulentos da Caixa Econômica Federal. Uma das empresas beneficiadas desse esquema da Caixa foi a JBS, do empresário Joesley Batista.
Em junho, em uma entrevista à revista Época, Joesley disse que o “PMDB da Câmara” atuava como “a quadrilha mais perigosa do Brasil”, da qual Temer era “o chefe”.
A crise na delação da JBS#
Foto: Nexojornal
Janot apresentou contra Temer, no dia 26 de junho, uma primeira denúncia, pelo crime de corrupção passiva. No entanto, essa denúncia acabou barrada pela Câmara, no dia 2 de agosto – os deputados têm prerrogativa de autorizar ou não processos contra um presidente da República.
Há uma expectativa quanto a uma possível segunda denúncia contra Temer, agora por formação de quadrilha – aqui existe uma relação com a “quadrilha do PMDB da Câmara” – e por obstrução de justiça.
A questão é que as suspeitas sobre o presidente têm como ponto de partida as delações premiadas de Joesley Batista (foto), dono da JBS, e Ricardo Saud, lobista da empresa (há ainda complementos, como a delação do operador de câmbio Lúcio Funaro).
E a delação da JBS sofreu uma reviravolta inesperada. Novas gravações, entregues pela empresa ao Ministério Público no dia 31 de agosto e que vieram à tona dias depois, mostraram que os delatores não deram todas as informações que possuíam logo da primeira vez.
Os áudios novos sugerem que Joesley e Saud podem ter tido ajuda de um auxiliar de Janot, o hoje ex-procurador Marcello Miller, para arquitetar o plano de delação que seria celebrado oficialmente só depois com o Ministério Público, o que contraria a lei.
Alguns advogados consideram que todas as provas produzidas por eles devem ser descartadas, mas membros do Supremo dizem haver jurisprudência que garante a validade das provas, com anulação dos benefícios da delação premiada para ambos.
Janot pediu a anulação dos benefícios. O pedido foi feito na sexta-feira (8) e aceito pelo ministro Edson Fachin, que relata o caso JBS no Supremo. Joesley e Saud tiveram seu acordo de delação suspenso e foram presos no domingo (10).
Temer acusa Janot de persegui-lo. Na quarta-feira (13), o Supremo deve julgar um pedido de suspeição feito pelo presidente em relação ao procurador-geral. O peemedebista quer Janot fora do caso JBS. Será um dia decisivo, que pode selar o futuro de uma segunda denúncia contra o peemedebista.
Enquanto isso, no Congresso#
Se a segunda denúncia contra Temer sair, a Câmara terá de avaliá-la a fim de autorizar ou não o Supremo a abrir um processo contra o presidente. Enquanto isso, os parlamentares – boa parte deles alvo de processos na Lava Jato e em outras operações – tentam fazer avançar uma nova reforma política.
Para que possam ser aplicadas na eleição de 2018, as novas regras precisam ser aprovadas até o dia 7 de outubro – ou seja, exatamente um ano antes de os brasileiros irem às urnas.
Os deputados já aprovaram um texto-base que extingue as coligações entre partidos nas chapas de candidatos à Câmara, instituindo a possibilidade de haver apenas federações, que obrigam que a aliança seja mantida após a eleição. Também aprovaram a cláusula de barreira, que dificulta o funcionamento de partidos pequenos. As mudanças ainda precisam passar por mais votações.
Há ainda propostas polêmicas, cuja aprovação não está garantida. Uma das principais diz respeito à criação de um fundo público para o financiamento de campanhas políticas.
Além disso, há propostas de emendas constitucionais e projetos de leis que tratam de assuntos tão diversos quanto a extinção dos cargos de vice-prefeito, vice-governador e vice-presidente, ou ainda a aprovação de um sistema diferente para os ocupantes de cargos legislativos, chamado “distritão”, ou a variação chamada “distritão misto”.
João Paulo Charleaux
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