
“A melhor coisa para a segurança da Suécia e do povo sueco é aderir à Otan”, disse a primeira-ministra da Suécia, Magdalena Andersson, ao confirmar no início desta semana formalmente a intenção de Estocolmo de se juntar à maior aliança militar do mundo.
O anúncio abriu caminho para o fim dos 200 anos de neutralidade militar da Suécia – uma política de segurança que o país nórdico adota desde o século 19.
- Embora a maioria dos suecos tenha manifestado apoio à adesão de seu país à Organização do tratado do Atlântico Norte (Otan) em meio à guerra na Ucrânia,
- há, no entanto, muitos jovens que resistem à medida.
- Alguns até foram às ruas da capital sueca no fim de semana passado, condenando a perda da neutralidade militar como um passo que geraria mais violência no mundo.
“Aderir à Otan vai derramar mais sangue, porque a Otan é uma organização de guerra e não uma que trabalha pela paz”,
disse à DW Ava Rudberg, de 22 anos, presidente do partido sueco Esquerda Jovem, que participou do protesto.
“É uma aliança militar que cria mais guerra, e queremos manter a paz na Suécia.”
Linda Akerström, da Sociedade Sueca de Paz e Arbitragem, disse à DW que muitas pessoas estão indignadas porque a neutralidade em conflitos militares está amplamente ligada à identidade sueca.
- “Para muitas pessoas, esta decisão é uma grande mudança, porque, durante todos esses anos, muitos suecos se viam como vozes de paz.
- Mas agora, muitos sentem que a decisão de aderir a Otan é uma medida apressada, baseada no medo”, disse.
“Basicamente, tomar uma decisão tão importante em uma situação tão tensa e em grande parte baseada no medo é como ir ao supermercado quando você está com fome.
- E todos sabemos que esta não é uma situação em que você faz boas escolhas.
- Não houve um debate suficiente com ambos os lados representados para que uma decisão tão importante seja legítima”, acrescentou.
Prós e contras do fim da neutralidade
De acordo com a Otan, a Suécia declarou formalmente neutralidade em conflitos militares sob o reinado do rei Carlos 14 João, em 1834. Enquanto o país permitia que as forças alemãs transitassem por seu território durante a Segunda Guerra Mundial, Estocolmo continuou mantendo sua posição neutra.

Embora a Suécia tenha desempenhado um papel no Afeganistão ao enviar tropas para o país como parte da Missão de Apoio Resoluto liderada pela Otan até o final de maio de 2021,
- Alina Engström, analista de política de segurança da Agência Sueca de Pesquisa em Defesa, diz à DW
- que já desde a década de 1990, a Suécia vem aumentando sua interoperabilidade com a Otan.
Por conta disso, o país já adere aos padrões da Otan. O anúncio de ingressar na aliança foi “um pequeno passo no nível militar e operacional”, explica Engström.
Ela acrescenta que
- “os prós de abandonar o status militar de não alinhamento
- fazem com que a Suécia possa agora fazer parte do planejamento de defesa da Otan e desfrutar de garantias de segurança.
Mas os contras da adesão à aliança
- estão no fato de a Suécia ter que ser mais ágil para ajustar sua política de segurança e perder algum espaço de manobra na política externa e de segurança.”
“Lutando com a imagem de nós mesmos”
No entanto, Lisa Nabo, de 27 anos, presidente da ala juvenil do Partido Social Democrata da Suécia, afirma que,
- apesar da cooperação anterior com a Otan,
- perder oficialmente a neutralidade é um problema que muitos jovens suecos têm dificuldade em aceitar.
- “Minha geração está na casa dos 20 anos agora. Não temos memória de uma guerra na Europa.
- Portanto, essa situação em que estamos agora é muito desconhecida para nós,
- e não temos a mesma história de guerra que muitos de nossos países vizinhos, que fizeram parte da Segunda Guerra Mundial ou da guerra na Iugoslávia”, afirma.
“Como jovens social-democratas, estamos lutando um pouco com a imagem de nós mesmos agora, porque muitos de nós começamos nossa carreira política com a ideia de que éramos uma organização pacífica que lutava para acabar com a militarização.
É difícil combinar isso com a adesão à Otan. Mas é claro que respeitamos a decisão do nosso partido, que foi democrática e unânime, e nosso foco agora é garantir que ainda possamos ser uma voz importante para a paz no mundo”, acrescenta.
E não é como se todos os jovens suecos fossem contra a adesão à Otan. Há muitos que pensam que, à luz da guerra na Ucrânia, é a decisão certa na hora certa.
“Estou feliz com o anúncio do governo”,
diz Martin Aberg, um jovem sueco em Estocolmo.
“Com a adesão da Finlândia, seria estranho se fôssemos o único país nórdico que não está na Otan. Então, a Rússia poderia ver a invasão da maior ilha da Suécia, Gotland, como uma boa opção. Basta olhar para a Ucrânia, que não está na Otan.”
A assessora política sênior Linn Soderlunds, de 29 anos e baseada em Bruxelas, ecoou uma visão semelhante, acrescentando que a adesão da Suécia e da Finlândia à Otan também fortaleceria a região do Báltico contra as ameaças russas.
“Aderir à Otan é a decisão certa na atual situação de segurança. Já poderíamos ter entrado em 2014, quando a Rússia anexou a Crimeia”, afirma.

Direitos sob ameaça?
Enquanto isso, longe das movimentadas cidades da Suécia, Sara Andersson Ajnnak, uma jovem artista que pertence ao povo lapão, ou sámi, no norte do país, acha que a decisão da Suécia de ingressar na Otan pode afetar os direitos da etnia.
- “Sinto que é problemático para a Suécia aderir à Otan, especialmente para mim como indígena no norte.
- Sinto que já existe uma briga por terra no país e acredito que a Otan pode ver o norte da Suécia, que é território indígena, como uma enorme região militar para realizar seus exercícios.
- Então, eu só vejo isso como mais uma forma de colonização”, explica.
“Ainda hoje somos afetados pela atividade da Força Aérea, que afeta a população de renas. Essas atividades agora devem aumentar, e estou com medo de como essa decisão afetará nossos direitos e o meio ambiente.”
Mas a primeira-ministra do país enfatizou que, embora a adesão à aliança militar seja uma garantia de segurança para Suécia em meio ao atual ambiente de segurança da Europa, a Suécia recusará armas nucleares e bases permanentes da Otan em seu solo.
Nova identidade militar
Mesmo que a decisão de aderir à Otan e desistir da neutralidade já seja fato consumado, a sueca Ida Jansson, de 30 anos e que trabalha como diretora de políticas em Bruxelas, diz à DW que
- muitos de seus colegas na Suécia desejam ter mais discussões em nível nacional,
- para entender o que a Otan faz
- e o que isso significa para a nova identidade militar da Suécia.
“Pessoalmente, por praticidade, entendo por que precisamos nos unir à Otan nas circunstâncias atuais. Mas a história nos ensinou que a segurança coletiva raramente impede conflitos.
Isso faz parte de uma discussão mais longa que precisaríamos ter tido em nível nacional antes de ingressar, assim como para entender as obrigações e os benefícios da adesão à Otan”, afirma.
“Mas considerando que é um ano eleitoral na Suécia, tem sido politicamente impossível dar espaço para um debate político racional. Temo que, sem essas discussões, será muito difícil para os suecos.
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Priyanka Shankar
Fonte: https://www.dw.com/pt-br/adesao-a-otan-e-polemica-entre-juventude-sueca/a-61869272
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