… a decisão “resultou de um processo muito longo de reflexão e meditação”.
Vítor Coutinho: a decisão “resultou de um processo muito longo de reflexão e meditação”.
Foi uma “opção delicada, séria e difícil” que não foi decidida “de ânimo leve”, mas antes “resultou de um processo muito longo de reflexão e meditação”.
Desta forma, Vítor Coutinho, que até final de Janeiro exerceu o cargo de vice-reitor do Santuário de Fátima, explica as razões que o levaram a pedir para deixar aquele cargo e, no passado dia 16, a solicitar ao Papa a dispensa do exercício do ministério de presbítero.
- “Uma decisão de deixar o ministério sacerdotal nunca é tomada de ânimo leve”, diz, em declarações exclusivas ao 7MARGENS.
- “Também no meu caso resultou de um processo muito longo de reflexão e meditação”, acrescenta.
O Decreto de suspensão com o “pedido de dispensa das obrigações do estado clerical e do celibato”
- foi publicado na página da diocese na internet e assinado pelo bispo de Leiria-Fátima, cardeal António Marto, n0 passado dia 19, sexta feira.
- Mas a notícia acabaria por ser divulgada apenas nesta quinta, 25, em vários meios de comunicação, ao mesmo tempo que era também publicada na Rede, a revista digital da diocese.
No decreto, o bispo de Leiria-Fátima faz saber que
- o até agora padre Vítor Coutinho formalizou, no passado dia 16, o pedido da “dispensa das obrigações do estado clerical e do celibato” através de uma carta dirigida ao Papa,
- como estabelece o Código de Direito Canónico (CDC).
- A “suspensão ad cautelam” do antigo chefe de gabinete do cardeal Marto – cargo que exerceu até Junho do ano passado – tem efeitos imediatos, diz ainda o decreto.
- A única excepção a esta suspensão é o que dispõe o cânone 976 do CDC:
“Qualquer sacerdote, ainda que careça da faculdade de ouvir confissões, absolve válida e licitamente quaisquer penitentes que se encontrem em perigo de morte, de todas as censuras e pecados.”
Aliás, o entendimento da Igreja é que a ordenação de padre permanece válida para sempre. Por isso, se fala em dispensa do exercício do ministério e não em retirada da ordenação.
O decreto do cardeal Marto não faz mais do que cumprir a formalidade do que acontece nestes casos e referem sempre a “dispensa das obrigações do estado clerical e do celibato”. O que não quer dizer que a situação de cada caso se deva (apenas) à disciplina celibatária.
No caso de Vítor Coutinho, a norma do CDC aplicada diz que
“o clérigo perde o estado clerical (…) por rescrito da Sé Apostólica; o qual só é concedido pela Sé Apostólica (…) aos presbíteros por causas gravíssimas”.
O que significa que a pessoa terá tomado uma decisão ponderada e irreversível.
A prática sobre estes casos, aliás, mudou muito nos últimos 20 anos:
- com o Papa João Paulo II, até 2005, o Vaticano só em casos muito raros concedia a dispensa.
- Com Bento XVI, entre 2005 e 2013, a prática foi aliviada:
- o princípio mantinha-se mas, se se provasse que a decisão era amadurecida, a dispensa era concedida.
Em ambos os casos,
- um “ex-padre”,
- assim chamado erroneamente à luz da doutrina católica,
- não era admitido nem sequer a dar catequese a crianças, mesmo que em alguma paróquia houvesse falta de catequistas, por exemplo.
Já com o Papa Francisco, a decisão passou a ser a de conceder a dispensa na condição de que haja ponderação da decisão. E incentiva-se mesmo que a pessoa que pediu a dispensa possa continuar a colaborar nas paróquias ou grupos em que está inserida.
“Convergiram factores internos e externos”
“Raramente se toma uma decisão destas, sobretudo na fase de vida em que me encontro, por um motivo só”, explica o ex-vice-reitor do Santuário de Fátima. Foto: DAQUI – Direitos reservados.
Sobre os motivos concretos do seu pedido de dispensa do ministério, Vítor Coutinho diz que não há uma razão única:
- “Raramente se toma uma decisão destas, sobretudo na fase de vida em que me encontro, por um motivo só”, explica.
- “Convergiram factores internos e externos que levaram a questionar a minha capacidade de continuar este serviço à Igreja, que ao longo dos anos procurei desempenhar com toda a dedicação e lealdade.”
De facto, o ex-vice-reitor diz que não tem, para já, qualquer trabalho em vista. Mas pede escusa para acrescentar outros elementos:
- “As razões são muito profundas e pessoais”, diz.
- “Como se compreende, há um pudor natural que nos leva a reservar para a nossa intimidade opções tão marcantes como esta.”
Colocado, no entanto, perante o facto de ter exercido cargos de responsabilidade na diocese – e até com alcance nacional na vida da Igreja Católica – Vítor Coutinho admite:
“Sem dúvida, o facto de um padre deixar o ministério diz respeito à comunidade cristã a que ele pertence. Já as razões dessa opção – insiste – pertencem ao âmbito estritamente pessoal e estão protegidas pelo direito de cada ser humano à privacidade.”
Vítor Coutinho, que foi também o responsável pela comissão das comemorações do centenário de Fátima, diz ainda ao 7MARGENS que
- “para além de todos os motivos que tornam esta opção delicada, séria e difícil”,
- acresce o facto de se sentir “muito bem nas funções que desempenhava no Santuário de Fátima”.
- Trabalhava com “uma equipa muito dedicada e profissional, com um excelente ambiente de trabalho, numa missão envolvente”, justifica.
O exercício do ministério sacerdotal não se esgota, no entanto, “na actividade profissional que realizamos através dele”. Por isso, considerou que, “em coerência com o que interiormente” entendeu como “o mais acertado”, tomou “serenamente esta decisão, mesmo não tendo em vista nada” para o futuro.
Ordenado padre há 30 anos, em 1991, Vítor Coutinho doutorou-se em Teologia na Universidade Westfälische Wilhelms, de Münster (Alemanha), com especialidade em Ética Teológica. Leccionava na Faculdade de Teologia da Universidade Católica, no âmbito da Bioética, Ética sexual e Ética fundamental.
Faz parte das regras, também, que uma vez pedindo a dispensa do ministério, só poderá voltar a dar aulas na Católica depois de obtida a resposta do Papa.
Sem querer antever o futuro, Vítor Coutinho conclui:
“Fiz os procedimentos canónicos previstos para a suspensão do ministério. Agora, inicio um novo capítulo de vida, levando na minha história tudo o que vivi e recebi nas missões que fui realizando enquanto presbítero.”
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