Eis o artigo.
Bolsonaro é um jogador das trevas. Aposta nos becos labirínticos e tortuosos do caos.
- Quanto mais escuras e obtusas as circunstâncias do momento, maior sua habilidade perversa no jogo da confusão e da polêmica.
- Inútil esperar dele, ou de sua seita de fanáticos, qualquer tipo de lógica.
- Em lugar de um discurso racional, articulado e argumentativo, prevalece o princípio do “quanto pior melhor”.
No terreno ambíguo de toda e qualquer crise,
- põe-se a semear disputas, discórdia, violência e uma avalanche de notícias falsas ou distorcidas,
- na perspectiva de colher votos.
Para isso, e às barbas do capitão, foi criado o chamado “gabinete do ódio”.
Os opositores são tratados como inimigos, sempre sob tiroteio cerrado de ataques, ofensas e difamações. Dele e comparsas, não podemos esperar o diálogo político, o qual, embora tenso e conflituoso, pode ser realizado de forma cordial e civilizada, em função do bem-estar comum.
A explicação para essa aposta no caos é simples.
- Toda crise gera um medo generalizado na população.
- E o medo costuma ser o sentimento que mais rápida e facilmente se partilha.
- Se e quando alimentado por informações habilidosamente fabricadas e desencontradas, desencadeia uma sensação de caos, como também de instabilidade social.
Semelhante situação escorregadia, por sua vez,
- pode chegar à beira do terror, do pânico de um abismo sem fundo.
- Daí uma busca desesperada pela ordem e pela segurança.
- O chão movediço debaixo dos pés leva a depositar a própria liberdade aos pés de quem oferece um pedaço de pão (ou “auxílio emergencial”).
Esse salvador, com raras exceções, encarna a figura do poder forte, patriarcal, autoritário. Prova disso encontramos em Trump, nos Estados Unidos, e Bolsonaro, no Brasil. Neles, o autoritarismo é a negação da autoridade, da mesma forma que o populismo neutraliza a ação popular.
Nessa linha de pensamento, o contexto crítico da chamada “transição epocal” em que vivemos, e que se aprofunda desde as últimas décadas do século XX e início do século XXI, pavimenta a estrada para o avanço dos governos de extrema direita.
Também explica a bandeira ideológica do nacionalismo populista.
- Momentos de rápida ascensão social, econômica e política, por um lado, e, por outro, tempos de queda e declínio, costumam ser pródigos em oportunistas de toda espécie.
- Indefinições históricas, instabilidade social, vertigem pessoal, horizontes nebulosos e falta de sentido – são fatores que, combinados e entrelaçados, constituem o terreno fecundo para o nascimento e florescimento do oportunismo.
A década de 1930, logo após o crash da bolsa de New York, em outubro de 1929, seguida da grande depressão, é exemplo disso.
Fortaleceram-se então os regimes totalitários de Hitler, Stalin, Franco, Salazar, Mussolini…
- Ondas de turbulência se agigantam e rondam nossas frágeis embarcações.
- Os gemidos, gritos e sofrimento da população mais parecem braçadas de náufragos, sobreviventes solitários de uma tempestade.
- Agarram-se à primeira tábua de salvação, à primeira mão estendida.
Foto: Divulgação
Cabe citar o livro O medo à liberdade, de Erich Fromm.
- É preciso levar em conta, ainda, que em épocas fortemente marcadas pela crise, o caos e a vertigem, o eleitorado tende naturalmente para a direita.
- Implícita e instintivamente, receia as mudanças e as novidades.
- Teme toda e qualquer ruptura que possa fugir ao controle de quem comanda.
- A tendência, ao contrário, é assumir posturas prevalentemente conservadoras, com os olhos voltados para o passado e a tradição.
- Diante da incerteza, raras vezes trocamos o caminho conhecida pela via desconhecida.
Por isso é que, em semelhantes ocasiões permeadas de dúvida, as massas populares apostam de preferência na manutenção da ordem, na estabilidade social e política, na continuidade do status quo.
Cresce a atração pelas forças ligadas à ideologia de direita, na exata proporção em que aumenta a rejeição pelas organizações vinculadas a qualquer ideologia social transformadora.
Baralhar as cartas do jogo a tal ponto que todos os envolvidos se sintam inseguros, mesmo que seja em meio a uma pandemia, é uma forma de plantar instabilidade e insegurança, para colher o voto dos incautos.
Medo, crise e caos provocam cegueira, e esta favorece tiranos e tiranias.
Fonte: http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/605894-bolsonaro-messias-do-caos
Leia mais:
- Transição epocal: Chegou a vez de a sociedade assumir o protagonismo da História
- Metade da população brasileira foi beneficiada pelo auxílio emergencial do Governo em junho
- Em meio à pandemia, Bolsonaro acelera medidas para beneficiar desmatador, armamentista e evangélicos
- O autoritarismo de Bolsonaro e a falta de autoridade do Congresso e do STF para coibir abusos comandados pelo presidente. Entrevista especial com Roberto Romano
- Há 75 anos, Bonhoeffer queria parar Hitler
- A preciosa definição de fortaleza de Erich Fromm
- Quando Mussolini tentou impedir a eleição de Pacelli, papável “político demais”
- Governo Bolsonaro: a prova que os “demônios” existem
- Biógrafo de Stalin esbarra em revisionismo
- Ausência de ideologia de câmbio e a base para a guinada à direita
- A presidência de Trump e o antiamericanismo católico
Excelente análise. Estamos num círculo vicioso perfeito:o poder autoritário gera o caos e a insegurança que legitimam o apoio do povo ao populismo do poder autiritário. O que vende a segurança é o mesmo que gera a insegurança. Manter ativados os sentimentos de medo e de raiva
como eficientes dispositivos de mobilização das massas.