
A ‘bênção’ da sexualidade por parte do Papa é uma declaração mais revolucionária do que possa parecer. Essa abertura tão explícita começa a abalar a desconfiança com a qual o catolicismo (e não somente este) sempre tratou o prazer, como um obstáculo à espiritualidade.
Considerando, em vez disso, sua compressão, um meio para a ascese.”
Vou partir dessa observação do jornalista Marnetto, que envia por e-mail suas reflexões muitas vezes sábias e profundas.
O artigo é de Dacia Maraini, publicado por Corriere della Sera em 05-02-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
- que ousou romper com uma tradição profundamente enraizada na história da Igreja:
- a fobia sexual que permeou os escritos de tantos importantes e amados Santos Padres,
- a prática inclusive confessional, de fixar a atenção sobre o pecado erótico
- em vez de tentas outras transgressões que deveriam preocupar o bom cristão.
Imagem: Desenho de Paola Formica
A predileção pelo sofrimento e sacrifício tem sido uma característica constante do ensinamento católico e pesou principalmente sobre a vida das mulheres. Por muitos séculos sistematicamente exaltou
- a mortificação da carne,
- a supressão do desejo,
- a culpabilidade de todo pensamento erótico.
E as mulheres introjetaram de tal forma esses tabus a ponto de considerá-los naturais.
Somente as místicas desobedeciam transferindo seu desejo sensual para o corpo sagrado de Cristo. E foram repreendidas e censuradas por isso.
Algum tempo atrás
- fiz uma pesquisa sobre a literatura erótica feminina
- e descobri com surpresa que se trata sempre da reivindicação de uma liberdade de prazer com sofrimento.
Romances
- que pretendem exaltar a rebelião e a liberdade erótica,
- concentram-se paradoxalmente no prazer da dor.
O máximo da liberdade é considerada a escolha do próprio torturador.
Na minha opinião
- isso é a negação de toda liberdade,
- e é uma dupla escravidão por não ser reconhecida como tal.
Por todas essas razões, as palavras do Papa hoje resultam importantes e revolucionárias.
É uma pena que a imprensa mal tenha tratado do assunto.
É uma mudança de curso de uma navegação milenar.
- “Somente aquele que respeita as próprias necessidades com sobriedade – conclui Marnetto –
- entende melhor as dos outros
- e luta para remover as causas que as reprimem.
Somente com a desconsagração do sofrimento, o empenho religioso e político torna-se inseparável”.
Dacia Maraini
Fontes: http://www.ihu.unisinos.br/586453-a-virada-corajosa-do-papa-bergoglio
.
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