Giovanna Costanti – 15 Setembro 2018
Foto: Carta Capital – No momento do ocorrido, havia aproximadamente 30 funcionários e 400 pessoas em situação de rua acolhidas, dentre elas jovens, crianças e mulheres
A reportagem é de Giovanna Costanti, publicada por CartaCapital, 14-09-2018.
Na manhã desta sexta-feira 14 cerca de 20 homens da Guarda Civil Metropolitana (GCM) invadiram, de forma truculenta, o Centro Comunitário São Martinho de Lima, na Mooca, zona leste de São Paulo. Segundo testemunhas, o
- tumulto começou ainda na rua,
- quando guardas tentaram recolher os pertences de um grupo de moradores de rua.
Chovia forte no momento da ação.
O padre Júlio Lancellotti, membro da Pastoral Povo da Rua,
- foi chamado quando o tumulto aumentou
- e os guardas começaram a agir com violência.
Segundo o padre, os guardas o reconheceram, referindo-se a ele como “padre de merda”.
“O reforço da GCM veio com bala de borracha, bomba de gás e pistola de choque para o confronto com o povo de rua”, informou padre Júlio, com a voz abatida. “Eles bateram com cassetete, deram socos e cuspiram, inclusive em mim”.
Assustados, algumas vítimas reagiram com pedras e outros fugiram para o Centro São Martinho, uma organização católica que acolhe diariamente pessoas em situação de rua. “Tentei conversar para impedir que invadissem, mas não funcionou”, contou Lancellotti.
Segundo ele, o confronto foi violento e a GCM invadiu direcionando gás de pimenta aos funcionários e às pessoas acolhidas pela instituição. “Entraram na cozinha e no banheiro, onde estavam as mulheres que ficaram assustadas. Eles foram muito agressivos e houve um confronto muito forte”, explicou.
O gerente administrativo da São Martinho, Emerson Ricardo Ferreira, não estava no local quando o confronto ocorreu, mas conversou com testemunhas e vítimas. Segundo ele, em 28 anos de funcionamento da instituição algo dessa gravidade nunca havia ocorrido.
“Não posso falar sobre o que ocorreu na rua, mas a truculência aqui dentro partiu apenas da GCM. Todos tentaram apaziguar a briga, menos a GCM. Eles entraram com escudos e armas, não houve qualquer tipo de diálogo”,
contou Emerson, que também assistiu às gravações. Segundo ele, no momento do ocorrido,
- havia aproximadamente 30 funcionários
- e 400 pessoas em situação de rua acolhidas,
- dentre elas jovens, crianças e mulheres.
Ambos os entrevistados ainda tentam entender o que motivou uma invasão tão violenta. O padre acredita que os guardas tinham como alvo um rapaz que estava entre o grupo que foi agredido ainda na rua.
Segundo Emerson, o Centro São Martinho
- publicará uma nota de repúdio
- e fará um boletim de ocorrência.
Lancellotti também informou que
- o Ministério Público entrou em contato,
- pediu as gravações
- e um promotor foi contatado.
Segundo o padre, o Coronel José Roberto, da Prefeitura de São Paulo também foi informado e alegou que há feridos em ambas as partes.
Já é uma prática conhecida da Prefeitura
- a retirada de cobertores, roupas, papelões e barracas
- da população em situação de rua,
- que necessita desses pertences para se proteger do frio.
Padre Júlio relatou que as ações truculentas por parte da GCM tem sido frequentes em toda a cidade. “Hoje a gente sofreu o que os irmãos de rua sofrem todos os dias: pancadaria, xingamentos e a tomada de pertences”, contou Emerson.
Procurada por CartaCapital, a Guarda Civil Metropolitana não respondeu até o momento da publicação desta matéria.
Giovanna Costanti
Leia mais:
- Na perseguição a Lancellotti, o desejo de esmagar os pobres
- Júlio Lancellotti: ‘A população tem que reagir, porque num dia é o pobre e no outro são todos’
- Padre Júlio Lancellotti refuta nova ação de Doria e Alckmin na Cracolândia
- Moradores de rua: ”É preciso ter coragem para amá-los”. Entrevista especial com Júlio Lancellotti
- Perdão, um ato de dignificação. Entrevista especial com Julio Lancellotti
- “A grande mudança seria pensar o bem-estar dos mais fracos”. Entrevista com Julio Lancellotti
- Padre Júlio Lancellotti é intimidado por ter dado entrevistas contra a PM
- “Manifestação pacífica é a marcha para Jesus; manifestação é cobrança e sempre há tensão”. Entrevista especial com Júlio Lancellotti
- Dom Paulo Evaristo Arns, o cardeal de uma Igreja em movimento. Entrevista especial com Fernando Altemeyer Junior e Júlio Lancellotti
- Padre defensor de moradores de rua é ameaçado. Igreja pede providências
- 70 anos de luta pelos Direitos Humanos: e agora?
- Os direitos humanos em um mundo pluralista e desigual: contribuições das universidades jesuítas
- A Declaração universal de direitos das pessoas humanas não se universalizou
- A construção permanente dos sentidos dos Direitos Humanos. Entrevista especial com Fernanda Bragato
- Estamos indo em direção a um mundo sem direitos humanos?
- Em meio ao frio, moradores de rua relatam sofrimento sob a gestão Doria
- O que é melhor para a população em situação de rua em São Paulo?
Leave a Reply