Essa opinião é a que predomina no Ocidente e mais ainda entre os alemães, que veem o vencedor do Prêmio Nobel da Paz de 1990 como um dos pais da Reunificação e o encheram de prêmios e honrarias –
- uma situação que só reforça o aspecto trágico de Gorbachev
- nunca ter experimentado reconhecimento semelhante em seu próprio país.
Duas palavras russas
Nascido em 1931 no Cáucaso do Norte, Mikhail Sergeyevitch Gorbachev
- fez rápida carreira político-partidária,
- sendo nomeado secretário-geral do Partido Comunista pela mais alta elite soviética em março de 1985.
Então com 54 anos, o jovem e dinâmico Gorbachev tinha por tarefa
- fazer com que a segunda superpotência do mundo, a União Soviética, saísse da estagnação em que se encontrava – sobretudo a econômica.
- Gorbachev encarou a tarefa com uma determinação incomum para reformas, com o objetivo de transformar estruturas burocráticas e corruptas.
Os termos russos Glasnost (transparência) e Perestroika (reestruturação), usados para denominar essas reformas, tornaram-se conhecidos em todo o mundo.
Para garantir que essas reformas internas seguissem seu curso, o líder soviético
- apostou numa política de paz e distensão com os EUA e seus aliados ocidentais na Guerra Fria –
- com consequências então imprevisíveis para a história mundial.
Pois, ao ser eleito presidente da União Soviética, em 1990, a periferia do império soviético já havia se dissolvido.
- As pessoas nas repúblicas no leste da Europa Centro-Oriental se libertaram de suas ditaduras socialistas em meados do memorável ano de 1989.
- O Pacto de Varsóvia – a aliança militar comandada pelos soviéticos – estava em ruínas.
- E na Alemanha Oriental, a presa mais importante que a União Soviética obtivera durante a Segunda Guerra Mundial,
- as pessoas não apenas exigiam liberdade e democracia, mas também a união com a Alemanha Ocidental.

Para a irritação de muitos conservadores soviéticos, Gorbachev deixou que isso tudo acontecesse pacificamente.
Assim ele rompia com a política soviética de reprimir violentamente revoltas em sua esfera de influência. Certamente as suas convicções humanitárias o levaram a adotar essa postura, mas um papel importante foi desempenhado pela grande confiança que ele depositava no então chanceler federal alemão, Helmut Kohl.
Sim à Reunificação alemã
Mais tarde o ex-chefe de governo alemão escreveria:
- “As decisões pessoais de Mikhail Gorbachev numa situação histórica difícil, não devem ser subestimadas.
- Passadas 24 horas da queda do Muro de Berlim, a Stasi e a KGB [serviços secretos, respectivamente, da antiga Alemanha Oriental e da União Soviética] tentaram deixar claro para ele:
- as tropas soviéticas na Alemanha Oriental correm perigo, os militares soviéticos devem intervir. Gorbachev se opôs.”
A amizade entre Kohl e Gorbachev
- foi um fator importante para que o líder soviético tenha dado sua anuência à Reunificação, o que foi ratificado mais tarde através do chamado Tratado 2+4,
- assinado entre a Alemanha Ocidental e a Alemanha Oriental, bem como pela França, Reino Unido, União Soviética e EUA.
Colapso da União Soviética
Na mesma medida em que Gorbachev abrandava as relações internacionais e obtinha reconhecimento e confiança no Ocidente com a sua política,
- ele perdia poder político dentro da União Soviética.
- Sua política de reformas havia destruído as bases do sistema soviético sem criar novas novas instituições que o sustentassem.
Assim, enquanto europeus e principalmente alemães elevavam, no ano de sua Reunificação, em 1990, Gorbachev à condição de ídolo de uma revolução democrática e pacífica, a economia planificada soviética entrava cada vez mais em colapso.
As repúblicas soviéticas não russas – especialmente as repúblicas bálticas Estônia, Letônia e Lituânia – voltaram-se contra o centro do poder soviético-russo em Moscou.
- A crise alcançou também o centro do poder na Rússia, onde o futuro presidente Boris Yeltsin se preparava para assumir a liderança política.
- Os cidadãos da União Soviética, que não haviam eleito Gorbachev, mergulhavam cada vez mais na miséria e responsabilizavam diretamente o presidente por essa situação.

Se foi a política de Gorbachev que levou ao fim da União Soviética ou se o próprio sistema soviético não era mais sustentável ficará sendo um ponto de discórdia entre os historiadores.
Gorbachev perdia cada vez mais poder e prestígio. E com ele, a elite em Moscou via minguar seus privilégios e sua influência.
- Quando, em 1991, Gorbachev não atendeu às exigências da linha-dura soviética, que defendia uma intervenção pesada nas repúblicas separatistas, ela se rebelou contra ele.
- Gorbachev foi posto em prisão domiciliar na Crimeia.
- Mas o golpe falhou porque em Moscou a população, sob a liderança do recém-eleito presidente Yeltsin, ofereceu resistência.
Visões opostas
Quando Gorbachev voltou da Crimeia para Moscou, o mundo já era outro:
- as estruturas soviéticas estavam desvalorizadas, e seu cargo como presidente da União Soviética não existia mais na prática – também pelo fato de ter sido o próprio Gorbachev que havia colocado muitos dos golpistas em seus cargos.
- Assim, em discurso transmitido pela TV em 25 de dezembro de 1991, Gorbachev anunciou sua renúncia à presidência, poucas horas antes da dissolução da União Soviética.
- Com seu discurso de despedida, Gorbachev caiu na insignificância política em seu país.
- Como candidato nas eleições presidenciais de 1996, ele recebeu apenas 0,5% dos votos.
- No Ocidente, porém, Gorbachev continuou sendo popular e reconhecido mesmo depois de sua renúncia.
Essa visões opostas carregam algo de trágico, mesmo que fique a esperança de que, um dia, ele tenha uma imagem melhor também na Rússia. Nos livros alemães de história, de qualquer forma, ele sempre terá um papel importante e valorizado.
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Ingo Mannteufel
Fonte: https://www.dw.com/pt-br/gorbachev-desprezado-pelos-russos-amado-pelos-alemaes/a-18865347
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